Engenheiro Carlos Poço, a Santa Casa da Misericórdia de Leiria inicia em breve uma empreitada importante no Lar Nossa Senhora da Encarnação. Que projeto é este e que objetivos procura alcançar?
Este projeto é, acima de tudo, um ato de responsabilidade e de futuro. O Lar Nossa Senhora da Encarnação é uma das respostas sociais mais antigas e emblemáticas da Misericórdia de Leiria.
Está em funcionamento há mais de 30 anos, e embora tenha sido sempre objeto de manutenção e pequenos melhoramentos, chegou o momento de fazer uma reabilitação mais profunda dentro das possibilidades do orçamento disponível. Queremos garantir que o edifício cumpre as normas legais atuais e, sobretudo, que oferece aos nossos utentes condições de segurança, conforto e dignidade compatíveis com o século XXI.É uma obra que nasce de uma convicção: não basta cuidar, é preciso cuidar bem, e isso implica investir nas infraestruturas onde os cuidados são prestados.
Qual é o montante global do investimento e de que forma será financiado?
Resposta: O investimento total ascende a 793.927 euros e será financiado integralmente pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), no âmbito do Investimento RE-C03-i01 – Nova Geração de Equipamentos e Respostas Sociais. O PRR permitiu, finalmente, dar resposta a uma necessidade que já vinha sendo diagnosticada há muito tempo. Sem este instrumento de financiamento, dificilmente conseguiríamos realizar uma intervenção desta dimensão com recursos próprios. Mas é importante sublinhar que este não é um financiamento gratuito — é um compromisso. Obriga-nos a cumprir regras muito exigentes de elegibilidade, sustentabilidade ambiental, rastreabilidade de materiais e prazos rigorosos de execução, e tudo isso é positivo, porque nos força a fazer bem e com qualidade.
Quais são, concretamente, as intervenções previstas nesta empreitada?
O projeto foi dividido em cinco grandes lotes técnicos, de forma a facilitar a organização, a execução e o controlo da despesa. O primeiro lote é o mais estrutural e visa a remoção integral da cobertura existente, que contém fibrocimento com amianto. Esse material, hoje classificado como perigoso, será removido com todos os cuidados exigidos por lei, através de uma empresa licenciada. Depois, será instalada uma nova cobertura metálica tipo painel sandwich, com isolamento térmico e acústico, e serão refeitas as caleiras, pluviais e remates.
O segundo lote contempla a reabilitação das fachadas e terraços, com aplicação de sistema de isolamento térmico pelo exterior (ETICS, conhecido como “capoto”), correção de fissuras, impermeabilizações e acabamentos duráveis.
O terceiro lote prevê a substituição de todas as caixilharias, por sistemas de alumínio com corte térmico e vidro duplo, melhorando o conforto térmico e a eficiência energética. O quarto lote é dedicado à Segurança Contra o Risco de Incêndios (SCIE) — provavelmente o mais crítico. Inclui a compartimentação dos espaços, instalação de portas corta-fogo certificadas, adequação das vias de evacuação, nova sinalética luminosa e implementação das Medidas de Autoproteção (MAPs) em conformidade com as exigências da ANEPC.
Por fim, o quinto lote trata da substituição integral dos elevadores, garantindo acessibilidade plena e segurança de utilização para todos os utentes, funcionários e visitantes. A execução vai decorrer enquanto o lar continua em funcionamento? Sim, e esse é um dos aspetos mais delicados deste projeto. O Lar Nossa Senhora da Encarnação acolhe dezenas de residentes em regime permanente e não pode suspender a sua atividade. Por isso, a obra foi planeada de forma cirúrgica e faseada, para minimizar qualquer perturbação na vida dos utentes. Como já foi referido a grande intervenção irá ocorrer nas fachas e na cobertura.
Trabalharemos por lotes e em zonas isoladas, com planos de segurança e comunicação interna muito rigorosos. Temos consciência de que é um desafio logístico exigente, mas também acreditamos que, com planeamento e sensibilidade, é possível conciliar a obra com a vida quotidiana dos serviços. A componente ambiental e de sustentabilidade é um requisito do PRR. Que medidas concretas estão a ser adotadas nesse domínio?
Esse é um dos pilares fundamentais do projeto. O PRR obriga todas as entidades beneficiárias a respeitar o princípio DNSH – Do No Significant Harm, que significa “não causar danos significativos ao ambiente”. Isto traduz-se em várias práticas: utilização de materiais recicláveis e de baixo impacto ambiental, controlo rigoroso de resíduos de construção e demolição (RCD), separação seletiva, e envio para operadores licenciados.
Além disso, as soluções técnicas adotadas — como o sistema de isolamento térmico (capoto), as caixilharias de elevado desempenho e a nova cobertura com isolamento reforçado — vão permitir reduzir significativamente o consumo energético
do edifício, o que, a longo prazo, representa não só poupança financeira, mas também responsabilidade ambiental.
Quais são os prazos previstos para a execução e conclusão dos trabalhos?
O prazo global de execução é de 270 dias a contar da consignação, ou seja, cerca de nove meses de obra. Cada lote terá a sua calendarização específica, mas sempre dentro do cronograma global exigido pelo PRR, que impõe conclusão
total até 30 de junho de 2026.
Estamos a trabalhar para garantir que o concurso público seja lançado até ao final do ano assim como a respetiva adjudicação. Acreditamos que este é um calendário realista e compatível com o rigor que o PRR exige.
Que mensagem gostaria de deixar aos residentes, às famílias e à comunidade de Leiria sobre esta intervenção?
A mensagem é de confiança e de esperança. A Santa Casa da Misericórdia de Leiria está a fazer este investimento com o coração e com a razão. Com o coração, porque sabemos que cada melhoria aqui feita tem impacto direto na qualidade de vida dos nossos residentes. Com a razão, porque estamos a gerir com responsabilidade, garantindo que cada euro aplicado traz valor duradouro à Instituição e à Comunidade.
Durante o período das obras, pedimos compreensão a todos — aos residentes, às famílias e às equipas — mas garantimos que tudo será feito com respeito, segurança e profissionalismo. O Lar Nossa Senhora da Encarnação vai sair deste pro-
cesso renovado, mais eficiente, mais seguro, mais bonito e mais digno, preparado para servir melhor.
Depois de falarmos da obra, é importa lembrar que o Lar Nossa Senhora da Encarnação tem vindo, há vários anos, a apostar fortemente na qualidade do cuidado e na formação das equipas. Que papel tem o Referencial Humanitude que está a ser certificado no LNSE?
Tem um papel absolutamente central. Acreditamos que a verdadeira reabilitação de uma instituição começa pelas pessoas e não pelas paredes. O Referencial Humanitude, que adotámos na Santa Casa da Misericórdia de Leiria, é mais do que um
método de cuidados — é uma filosofia de relação, de respeito e de dignidade.
Trabalha-se a forma como se olha o outro, como se comunica, como se toca e como se estrutura o quotidiano dos residentes, sempre com base em quatro pilares fundamentais: olhar, palavra, toque e verticalidade. No Lar Nossa Senhora da
Encarnação, esta metodologia tem sido implementada de forma sistemática e exemplar. As nossas equipas de auxiliares, enfermeiros, terapeutas e coordenadores técnicos receberam formação intensiva, com sessões práticas e acompanhamento
contínuo. A mudança é visível!
Os residentes estão mais tranquilos, com mais qualidade de vida, os profissionais mais motivados, e o ambiente relacional tornou-se mais humano e positivo. Diria mesmo que este trabalho de formação e transformação cultural do serviço prestado no LNSE foi a fundação invisível desta obra física que agora vamos iniciar.
A obra de reabilitação do Lar Nossa Senhora da Encarnação é, à primeira vista, um investimento físico: novas coberturas, fachadas renovadas, janelas eficientes e sistemas de segurança de última geração.
Mas, como se percebe ao ouvir o Sr. Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Leiria, esta intervenção é muito mais do que engenharia e arquitetura — é a expressão concreta de uma visão humanista de cuidar. Hoje, o Lar Nossa Senhora da Encarnação é reconhecido nacionalmente como um modelo de boas práticas no envelhecimento com dignidade, e a futura reabilitação apenas reforçará essa liderança. A Santa Casa da Misericórdia de Leiria não está apenas a construir um edifício novo está a renovar uma forma de estar ao serviço da comunidade: com rigor, humanidade e esperança no futuro.
ENTREVISTA: SR. PROVEDOR ENG. CARLOS POÇO